Dez

Fico aqui pensando no significado do número dez. Na verdade, em se tratando de número, eu deveria ter um pouco mais de respeito com esse ser matemático e numerá-lo bem assim: 10. Pronto. Assim ganho a simpatia, o respeito e os parabéns do algarismo e dos matemáticos - menos dos professores de português, já que a maioria me abominaria por não escrever, num texto, um numeral por extenso. Deixemos as implicações acadêmicas de lado.

Fico a procurar o dez pela internet e me dou conta de que ele está em tantos lugares e em tantas palavras que fico “dez”animado de procurá-lo em tantas referências. Rádio Dez, agência de publicidade Dez, “as dez mais...”, aluno nota dez, dez motivos para não matarmos as baleias (dessas de “dez motivos para se fazer ou não fazer algo” encontro mais de uma dezena), as dez pragas do Egito e, com essas, os dez mandamentos dados a Moisés. “Puxa vida!”, eu penso, “até o Senhor tem uma simpatia pelo dez”. Dez pragas pra fazer um faraó teimoso se convencer de que Ele, Jeová, é quem comanda tudo e tudo pode fazer. Dez mandamentos pra fazer um povinho enjoado, que mesmo liberto da escravidão insistia em reclamar, poder andar na linha e não morrer e aprender a viver em harmonia. Um detalhe: os dez mandamentos do Sinai ainda fazem total sentido hoje em dia. Um mundo com pouquíssimos princípios como o atual poderia ser facilmente posto em ordem se todo mundo resolvesse seguir apenas dez regrinhas. Simples? Para alguns, “dez”esperador.

Vou ver as definições que um dicionário pode me dar. Em se tratando de número num catálogo de palavras fica difícil. O melhor que consigo é relembrar que ele é um número cardinal e que deriva da dificílima conta de somar ao nove mais um. Corro para uma enciclopédia das ciências matemáticas e me dou por satisfeito, não sei se por encontrar um maior número de definições ou por não entender muita coisa do que está escrito. Sei que cheguei ao meu limite exato (que fique claro que falo do termo derivado das ciências exatas) quando defronto-me com a confirmação de que o dez é um número defectivo. Para ter a confirmação de que não se trata de um numeral que faz uso do sanitário busco saber o que é um número defectivo. Estrambicou-se tudo e o máximo que pude compreender foi um antônimo do termo que atende pelo nome de abundante. Abundante ou desbundado fecho correndo a enciclopédia.

De repente, digitando, percebo: são dez os dedos da mão. E dez os dos pés. O dez me sustenta e me possibilita ganhar o meu pão de cada dia, já que, sendo jornalista, vivo de escrever. Fico “dez”lumbrado e passo a refletir na “dez”crição que fiz do numeral: concordo com tudo o que encontrei sobre ele, menos do defectivo, pois de defeito ele nada tem. Devia ser um número abundante, isso sim. Que os matemáticos invertam os termos se necessário. O número merece mais respeito pelo tanto que representa.

Dez segundos, dez minutos, dez horas, dez dias, dez meses. Cheguei ao ponto. Dez meses é o tempo que estou a namorar a Miguelli. É pouco perto da dezena de anos que quero passar ao lado dessa “dez”temida mulher que cuida de mim sempre que estou doente e me faz sentir bem por apenas poder olhá-la por um décimo de segundo. Pena que ela não faz aniversário no dia dez pra poder rimar com o tema da crônica.

Tiro uma conclusão de tudo isso: não “dez”confio mais do potencial do 10.