Diométria Royal

. quarta-feira, janeiro 23, 2008

Quando seu pai encontrou o namorado tentando se esconder embaixo da cama, só de cuecas, fez um escândalo. Ameaçou até abrir um processo contra o rapaz por invasão de propriedade privada. Mas desistiu da idéia ao ouvir a resposta do invasor.

- Olha, eu vou falar pro senhor. Eu nem queria muito. Mas ela me botou contra a parede e disse: “Tu é homem ou não”? Aí o senhor sabe, né? Duvidar da masculinidade é como xingar a mãe.

A tal “ela” era Suzana. Suzana Vieira. E é claro, as piadinhas e cantadas baratas envolvendo seu nome e o da atriz famosa eram constantes.

- Quer dizer, então que, aos cinqüenta você também ainda vai estar esse chuchu?
- Chuchu eu não sei, meu querido. Mas essa abobrinha que você está jogando pra cima de mim não te ajuda nem com a Dercy Gonçalves.

A acidez nas palavras era perceptível. A determinação também. Se bem que, nas palavras do irmão ela era, na verdade, mandona. E o episódio do namorado seminu debaixo da cama denunciava essa postura.

Depois do episódio, quis desistir de todo mundo na família. Chamou o pai de careta, a mãe de chorona (e ela chorou mesmo. Religiosa como era, não conseguia imaginar a filha deixando um namorado tocar-lhe qualquer parte do corpo acima dos joelhos, exceto as mãos) e o namorado de frouxo.

- Frouxo, mas porque frouxo? Eu vim até aqui! Fiquei até de cuecas!
- Ah, sim! E a parte em que você tremeu feito bambu velho quando meu pai te puxou pelos pés, hein? Me poupe! Frouxo!

Mandou tudo pro espaço. Falou que ia se mudar pra São Paulo. E mudou-se.

Chegando à capital paulista lembrou de uma aspecto importante: não conhecia ninguém na cidade. Todos os parentes viviam no Mato Grosso. Na verdade, apenas a irmã de sua mãe, que ela não via fazia uns dez anos, vivia em outro lugar: Porto Velho. No fim das contas, um lugar ainda mais longe que Cuiabá.

No entanto, foi essa tia, ou melhor, seu nome, que entrou na confusão de Suzana, mesmo depois de dez anos de ausência. Foi pensando na tia Diométria que começou a passar cheques sem fundo e cometer furtos. Não que a tia Diométria fosse uma espécie de vigarista rondoniano, mas é que a tia tinha esquecido um talão de cheques na bolsa de Suzana durante um passeio no shopping quando estava em visita a Cuiabá. Foi a saída ideal para começar a se dar bem em São Paulo. Além disso, o sobrenome da parente tinha uma pitada de realeza, o que ajudava a impressionar vendedores e gerentes.

- Olá! Seja bem vinda ao Hilton Plaza. Em que posso ajudá-la?
- Eu quero um quarto de luxo.
- Ah, querida. Todos os nossos quartos são luxuosérrimos! Um escândalo!
- Hmmm... Já que é assim, eu quero o mais escandaloso.
- Seu pedido é uma ordem, querida. Seu nome, por favor?
- Diométria. Diométria Royal.

A tal “real” passou algumas semanas na vida de picaretice. Na verdade, as primeiras semanas foram conquistadas com muitos cheques sem fundo. Mas como a ganância sempre pede um pouco mais...

- E o nome do senhor, qual é?
- Meu nome, mocinha? Tem certeza de que está falando comigo?
- Sim. Um coroa como você atrai a atenção de inocentes mocinhas como eu.
- Uh! Ai, meu pai! Me segura que eu vou ter um treco! Cadê o meu inalador, Jarbas?

Suzana, ou melhor, Diométria passou a aplicar golpes em velhinhos ricos e debilitados. Como todos os velhinhos ricos, eles sabiam que o interesse era mesmo no dinheiro, mas como já estavam quase no fim da linha, a carne fresca era sempre bem-vinda.

-Ai, Diométria! Assim você me mata do coração!
- Ai que bom!
- Como é que é?
- Ai que dom! Foi isso que eu disse. Você não acha que é o meu dom fazer você subir nas nuvens, meu pompom?
- Acho. Acho sim. Ai! Jarbas, o inalador!

Mas como ninguém é de ferro (não falo do velhinho, porque este não era mesmo), Suzana partiu pra um objetivo mais arriscado: conquistar playboys burros.

- E aí, minha Sharapova! Que tal uma partida de tênis? Só eu e você? De branco?
- Ah... não sei.
- Vem sim. Eu te pago um picolé.
- Um picolé? Ah, por favor.
- Ok, então. Vou parar de ser murrinha. Por você eu gasto o mundo inteiro. Te pago um Häagen-Dazs, que tal?
- Tô começando a mudar de opinião.
- Ótimo!
- Como a gente vai chegar no clube?
- De Mercedes, minha musa. De Mercedes.
- Perfeito! Amanhã, as oito.

O problema aconteceu no dia em que Suzana encontrou um playboy não tão burro assim. Depois que ela sumiu da casa do sujeito com dois quadros de Van Gogh, o rapaz virou uma fera e deu um jeito de encontrar a garota. Contratou um detetive e descobriu que ela já estava dando em cima de um outro playboy. Dessa vez, era no bairro dos Jardins.

Rapidamente, o rapaz ligou pra polícia e tratou de podar a vida boa de Suzana.

- A senhora está presa sob a acusação de furto e estelionato, senhorita Diométria.
- Que Diométria, meu filho! Meu nome é Suzana.
- Ah, é? Então, agora você também é acusada de falsidade ideológica. Tem algo a dizer em sua defesa?
- Tenho sim. Eu vou processar todos vocês. Eu sou inocente!

Não era. Depois que as autoridades confirmaram uma série de golpes cometidos pela garota de dezenove anos, foi parar detrás das grades.

- Suzana, eu sou repórter do telejornal local. Por que você fez isso? Afinal, é tão nova.
- Quer saber da verdade? Eu já estava ficando com saudade de casa. Fiz isso pra chamar a atenção dos meus pais. Beijo mãe!

No Jornal Nacional foi que a mãe recebeu o beijo. Ficou desesperada e disse que nunca mais ia ver a filha. Mas desespero maior foi o da tia Diométria. Ao saber que seu nome havia sido tão difamado resolveu mudá-lo. Tornou-se Regardina Monreale. Perdia o antigo nome, mas não perdia a realeza.